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Arbitragem e relação de consumo


Por Amélia Rocha (Defensora Publica e Professora)














1. A Presidência da República vetou, semana passada, dois parágrafos da Lei 13129/2015 que atualizam a Lei 9307/96 (conhecida como “Lei da Arbitragem”). Os órgãos consumeristas comemoram os vetos. Qual a razão da arbitragem ser inadequada às relações de consumo? 
RESPOSTA: A arbitragem é um instituto extremamente importante, necessário e eficaz, mas que pressupõe igualdade das partes e direitos disponíveis, tais quais as decorrentes de relações empresariais. Um dos principais – senão o principal – princípio do direito do consumidor é o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo; ou seja, justifica-se pela situação de desigualdade entre consumidor e fornecedor e, sendo uma relação de desigualdade, a utilização de arbitragem nas questões consumeristas parece tecnicamente inadequada.

2. Mas o direito do consumidor não é um direito disponível, direito puramente patrimonial, do qual se pode livremente dispor?
RESPOSTA: No direito do consumidor as “(...) normas são de direito privado, mas com forte interesse público, razão pela qual não pode o fornecedor ou o consumidor afastar tais regras pela autonomia da vontade”, como esclarece Roberta Densa. Ou seja, se o consumidor vai comprar um carro usado e lhe é oferecido um desconto de 20% desde que ele renuncie ao prazo de reclamação do artigo 26 do CDC – Código Brasileiro de Proteção e Defesa do Consumidor, por mais que o consumidor queira, tal acordo não teria validade, uma vez que o artigo 25 do CDC deixa expresso que “é vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas seções anteriores.”. Em outras palavras, pode-se dizer que o direito do consumidor – em nome da proteção da vida, saúde e segurança – não é de todo disponível e nem se resume a questão patrimonial, o que é mais uma razão para não ter na arbitragem – que pressupõe direitos disponíveis - meio adequado para dirimir conflitos a ele relacionados.

3. Outra razão pode ser a vulnerabilidade jurídica do consumidor?
RESPOSTA: Sem dúvida, pois, diante de sua vulnerabilidade jurídica, muitas vezes o consumidor nem sabe (a) o que é clausula compromissória; (b) o que é compromisso arbitral; (c) que não é obrigado ir à Justiça arbitral – que ir até ela é uma livre e autônoma escolha, jamais pode ser uma imposição; (d) que pode escolher o árbitro ou (e) que a sentença arbitral é irrecorrível. E o consumidor, pelo simples fato de ser consumidor é presumivelmente vulnerável técnico, jurídico, fático e informacionalmente. Sobre o tema, importante reflexão de Bruno Miragem em http://sao-paulo.estadao.com.br/blogs/seus-direitos/analise-aspectos-principais-da-nova-lei-que-aperfeicoa-a-arbitragem-no-brasil/ e de Claudia Lima Marques e Marilena Lazzarini em http://www.idec.org.br/em-acao/artigo/no-a-arbitragem-de-consumo.

Extraído do Jornal O Povo

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